António Manuel Couto Viana

O Senhor de Si

Numa das últimas páginas deste livro podemos aceder à “tábua do poemas”, um índice com os títulos dos 21 poemas, que foram escritos no período compreendido entre os finais de 1990 (Outubro) e inícios de 1991 (Abril).

Na leitura dos títulos é perceptível a carga pessoal e intimista dos poemas, denotando-se um possível percurso de crescimento pessoal, marcado pela presença e memórias das suas origens.

Mas seguindo a curiosidade provocada pela leitura inicial da “Tábua de Versos” mergulha-se no texto poético do autor, que neste livro tem uma marca claramente autobiográfica:

*   A irmã Adelaide Couto Viana a quem é dedicada a obra,…

*   as memórias do seu nascimento na casa que “oscilou como um barco no mar/…/ E, entre as rezas e ais, comecei a chorar. (p.7),

*   as memórias da infância,…

*   … as gotas de sangue, que marcam o desaparecimento de familiares… a primeira quando tinha cinco anos (Avô),… um amigo do Liceu (Trancredo, p.14)

Retábulo para um Íntimo Natal

” Retábulo para um íntimo Natal ” é uma recolha de dezasseis poemas, cuja maioria já fora publicada em outros volumes entretanto já esgotados. Outros, ainda que publicados, não faziam parte de qualquer livro do poeta (como vem referido na nota final ). Assim, é uma obra que se considera estar por concluir pois, ao autor, é sempre possível a criação de mais poesia sobre a temática do Natal – note-se as datas em que cada um destes poemas veio a publicação ; de 1959 até ao ano de 1979.

António Manuel Couto Viana, neste “Retábulo Para Um Íntimo Natal”, remete-nos para uma infância longínqua e repleta de alegria comovida – como bem ilustra o poema da página 17, “Improviso de Natal”.

Transporta-nos também para um tempo de inocência e sobretudo de imaginação porque nos natais do poeta não havia neve mas chuva fria…”Cada Natal recordo os meus natais” (página 21).

Em vários poemas, Couto Viana interroga-se se o Natal irá nascer de novo – Natal como metáfora de poesia que o poeta diz nascer também de um esforço, de um sinal…”Sob o tema Natal” (página 23).

Noutros textos ainda, o poeta, numa crítica adulta e lúcida, constata um Natal cada vez menos natal, só feito de rituais e requintes de arte…”Natal cada vez menos” (página 25).

Então, ciente desta fraqueza, o poeta preconiza a pureza do Natal primordial, de pinheirinho desprovido de qualquer decoração e, por isso mesmo, “…mais belo e vivo e humano.” (Página 30),” Primeira lição de Natal”.

Mas o Mundo, apesar de toda a escuridão, será sempre iluminado por esta fonte de esperança que o NATAL sempre representará.

Postais de Viana

Neste livro deixa Couto Viana apontamentos imagéticos (de lugares emblemáticos – “Rimance do Castelo de Viana”-, de obras de arte arquitectónicas – “A Ponte”” – e escultóricas – “Estátua de Viana” -, de tempos sagrados – “Páscoa”- da cidade de Viana, ) trespassados por uma inequívoca afectividade e que servem de pretexto para convocar figuras relacionadas com a vivência da cidade, ilustres pela qualidade artística -“Feijó” ou pela proximidade pessoal – “Meu avô”.

Mínimos

São quinze textos onde Couto Viana, num cantar magoado, se afirma ser quem foi e nos fala

a) de velhos sentados num banco de “jardim fronteiro ao mar” e com quem ainda se não identifica. Ali, apenas se busca, num “acto de coragem”:
“ainda sou quem passa
P’la mão da minha mão”

b) de Colombo e do “ser português”;

c) da vida/mensagem que um livro transporta;

d) do Natal que “cada criança é o Céu que vem / para nos remir do pecado”;

e) sobre as estações do ano;

f) da sua desilusão porque a caixa do correio continua sem qualquer mensagem para si

Hospital

Percorrendo a “Tábua” deste livro de poemas, sai reforçada a ideia de que os textos abordam vivências de alguém que se viu na necessidade de estar num hospital… constatamos a existência de doentes provavelmente companheiros de enfermaria, desde “O Chinês”, “O Doido Senil”, “O Bom Samaritano”, O “Filósofo” e “O Colérico”… Mas um hospital também é feito de “Dor” que muitas vezes é atenuada pela presença de “As Visitas”.

Também encontramos poemas com os títulos “corpo clínico”, “Pessoal de Enfermagem e “Pessoal Auxiliar”.

“O Juízo Final” é o último poema em que é marcante uma postura crítica em tom de apelo ao Ministro de Saúde, responsável máximo pelo barracão degradado que “tem o chão aos buracos” e onde o poeta jaz internado.