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Cancioneiro do Rio Lima

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972-588-126-5

Prefácio

Apresentação

A beleza idílica e a natureza bucólica da Ribeira Lima suscitaram, através dos tempos, as mais diversas expressões poéticas, tiveram consagração em lendas imortais e exercitaram a criatividade de consagrados artistas da expressão plástica.

Sem recuarmos à antiguidade clássica, onde não são raras as alusões entusiásticas à beleza da região limiana, nem mesmo à poesia trovadoresca, basta-nos verificar que, a partir da Renascença Portuguesa, muitos dos nossos poetas maiores encontraram na Ribeira Lima uma abundante fonte de inspiração para a sua veia lírica. Uns, como Diogo Bernardes e Frei Agostinho da Cruz, porque aqui nasceram e aqui levaram impressas na alma a visão inapagável dessa beleza; outros, porque aqui passaram e não puderam deixar de cantar a beleza que lhes incendiou a fantasia.

Com o decorrer dos séculos, muitos outros poetas de nível nacional, quer naturais, quer estranhos, se expandiram em efusões líricas de grande qualidade sobre a Ribeira Lima, imortalizando-lhe a graça, aluminosidade, a frescura verdejante, a limpidez das águas, o prateado das areias, a serenidade inocente e bucólica das veigas, a alegria e jovialidade das gentes, a criatividade dos trajes, o ritmo vivaz das danças e a expressividade buliçosa dos cantares.
De modo que bem poderíamos dizer que a Ribeira Lima foi berço de poetas e sempre cativou e fascinou os que aqui não tiveram berço, mas que da Ribeira se tornaram admiradores e cantores.

E bem poderíamos afirmar, também, que não será atrevimento dizer que esses poetas e as suas produções de temáticas ou alusões limianoas, estabelecem, dentro da literatura nacional, ou pelo memos regional, uma escola ou um estilo muito próprios que bem identifica o grupo dos poetas limianos.
E neste berço e alfobre de poetas também nascem e vicejam os bardos populares, aqueles que nos legaram verdadeiras pepitas líricas que, sem assinatura, andam por aí de boca em boca, anunciando paixões, caricaturando situações ou fustigando vícios e desmandos.

Dessa poesia popular já a Câmara Municipal editou o “Cancioneiro Temático da Ribeira Lima”, coordenado pelo Inspector Gabriel Gonçalves, que amplia e sistematiza, um outro mais antigo organizado pelo Coronel Afondo do Paço.

Mas da poesia erudita não havia ainda florilégio que reunisse em ramalhete algumas das melhores produções de temática limiana, especialmente daqueles vates que poderiam formar um grupo característico dentro da poesa regional ou nacional.

Por isso, A Câmara Municipal pensa ter prestado um bom serviço cultiral à região, editando o “Cancioneiro do Rio Lima” organizado por um dos maiores poetas vianenses e nacionais dos nossos dias – António Manuel Couto Viana.
O seu apurado sentido estático, o seu exigente critério do bom e do belo, a sua vasta cultura poética, garantem que os textos deste cancioneiro podem ser considerados verdadeiras jóias do lirismo limiano, frutos do estro dos melhores vates que por cá nasceram e dos muitos que pelas belezas da Ribeira Lima se deixaram seduzir.

Do grupo dos filhos do Rio Lima, encontram-se representados neste cancioneiro, entre alguns outros, Alfredo Reguengo, a família dos Feijós (António, Álvaro e Salvato), o próprio António Manuel Couto Vianae suas irmãs, Maria Manuela e Maria da Conceição, António Ferreira, Delfim Guimarães, João da Rocha (Frei), Teófilo Carneiro e a já Vianense, Maria Emília de Vasconcelos, além dos clássicos acima citados – os irmãos Bernardes.

De entre os grandes da poesia nacional que se deixaram encandear pela temática limiana, aqui se encontram, entre outros, Correia de Oliveira, António Nobre, João de Lemos, Pedro Homem de Melo e Sabastião da Gama.
É evidente que de um lote e de outro, muitos mais poetas estão incluídos neste florilégio, cujo conteúdos nos põe diante dos olhos muito do que de melhor se encontra na literatura portuguesa sobre o Rio Lima.

É motivo para felicitar A. M. Couto Viana, pela qualidade exigente desta selecção e agradecer-lhe penhoradamente mais este serviço prestado à cultura da cidade de que é ilustre filho.

Permito-me, também, desejar que mais esta iniciativa editorial da Autarquia vianense contribua para a educação estética dos leitores e para que as gentes da Ribeira Lima se orgulhem cada vez mais da sua inconfundível identidade cultural.

O Presidente da Câmara

Defensor Moura

Limiar

O rio Lima tem o seu nascimento em Espanha, na serra galega de s. Mamede e, tal como todos os seus irmãos, brotou do interior de umas penhas agrestes como veio débil de água, rumoejante e fresca, a escoar-se, límpida e lépida, entre ervagens, terra fofa e pedras; a engrossar mais adiante, por via das levadas, das chuvas, dos regueiros, impondo já o seu caudal, cada vez ais rápidos e largo, entre margens a altearem-se, primeiro atravessado a vau, com os pés chapinhando num arrepio agradável; depois, sobre arcos graníticos de pontes românicas ou góticas.

Pelos Estios, esgueira-se, coleante, como cobra líquida, nas areias quentes do leito.

Pelo Invernos, sofre a agressividade rouquejante e torrencial das cheias, a galgar cais e veigas, escuro e pesado, pondo em risco vidas, colheitas, casarios.
Faz agora parte saliente da paisagem, correndo entre montanhas que o saúdam de riba, com as muralhas roídas de um castelo, a torre sineira de uma igreja ou santuário, luzente de cal; a opulência armoriada de um solar; a fartura dos canastros, onde o pão ainda é oiro das espigas.

Percorreu 41 quilómetros de campos férteis, de ermos silenciosos, de densos pinheirais, em terras da infância, para vir espraiar-se, português e adulto, numa albufeira a servir o afã industrial, e, por fim, liberto, banhar vilas de altivo passado histórico (Ponte da Barca, Ponte de Lima, com suas pontes a tracejá-lo de elegância e austeridade) embelezando-as de azul e calma; recebendo, do seu único afluente, o Vez, mais vigor e amplitude; deslizando junto ao mimo dos relavados e à claridade dos areais, onde enxameia uma feira ancestral; precipitando-se das pequenas pesqueiras, numa cascata de gorgeios prolongados, túmido de trutas, de lampreias, de outro pesado palpitante, sentindo aflorar-lhe o dorso macio o casco rude e chato das embarcações, penetrado pela vara que as conduz, dura, firme, segura.

Mira-o, num cenário de aguarela doce, a alacridade, o colorido das leiras e leirotas, na faina suada das gentes da lavoira; o viço e sombra dos parreirais, das hortas e pomares, dos milheirais ondulantes, do negrume do torrão sulcado, semeado, depois alardeado o ímpeto dos gomos e das seivas, até à alegria das vindimas e das ceifas.

Rio moroso, remansado, o seu nome de Lima tem sabor a fruto mélico e refrescante.

Rio feiticeiro, as legiões da Roma imperial, que lhe queriam passar a pausada corrente, num arruído arrogante de conquista, temeram-lhe a formosura, quedaram-se, hesitantes, na margem, evocando-o como Lethes lendário, o rio do Esquecimento, capaz de lhes fazer perder a memória dos próprios nomes, da família, da pátria distante, pelo poder do seu sotilégio, do seu encantamento de paraíso.

Lenta, lentamente, as águas vão-se-lhe embebend do sal marinho, tão próximo o estuário da foz, avistada, com espanto, a urbe monumental vianesa, no esplendor da antiguidade e na explosão do progresso.
E logo elas, dosseladas pelas asas agitadas das gaivotas, são espelho puro de jardins floridos, de cais de pedra, onde aportam navios, traineiras, pequenos barcos de pesca, e se levantam ao céu os braços gigantes e musculados dos guindastes, e onde o breve oscilar espúmeo das vagas escuta o bulício da cidade palreira, mercadejando, lidando, vagueando…

Rio de poetas, vêm-no louvando, desde a fronteira, muitas vozes líricas que enobrecem as páginas da nossa História literária.
Rio o mais celebrado em verso, depois do soberbo Tejo das caravelas e o suspiroso Mondego dos amores e das lágrimas haviam de recolher-se-lhe, um dia, as mais belas loas que lhe lançaram os seus cantores apaixonados.
Quis eu atrever-me a fazê-lo, com a culta aquiescência da Câmara Municipal de Viana do Castelo, elegendo, entre uma centena de poesias, aquelas que a minha sensibilidade considerou as mais dignas do seu brando peregrinar cristalino e saudoso.

E ei-las nesta obra, tantas elas de poetas limianos, quantas de outros de outras bandas; um, mesmo, das longínquas plagas brasileiras.

Lê-las, decorá-las, é como que sentir na alma, gota a gota, rima a rima, estrofe a estrofe, o frémito de um rio, do nosso Lima “diluído em água”, como o definiu o génio de um troveiro seu.

Com verdade e arte!

Páscoa de 2001

António Manuel Couto Viana

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