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O Primeiro Foral de Barcelos

Obra que, como o título indica, apresenta um estudo detalhado sobre o primeiro foral concedido a Barcelos.
Sem prefácio ou qualquer outra nota introdutória, o autor debruça-se, primeiramente, sobre questões relacionadas com a posição geográfica da actual cidade e sua contribuição para o desenvolvimento da mesma, para de seguida versar sobre o momento histórico em que lhe foi concedido o primeiro foral (época em que Barcelos era um dos locais preferidos para os viandantes passarem o rio Cavado, o que atraiu população àquela zona. Para tal concorreu ainda a existência de extensas terras férteis e a necessidade de se estabeleceram regras e meios de propiciar condições de estabilidade e de segurança à população que ia crescendo) e a data em que tal ocorreu (à versão existente que é a que foi confirmada por D. Afonso II falta-lhe a data. Todavia, outros dados permitem situar a outorga do primeiro foral entre 1156 e 1167. Matos Reis acaba por situá-la entre 1166 e 1167). As obrigações e direitos dos habitantes (um estatuto jurídico igual ao dos habitantes de Braga, assim como o pagamento de iguais coimas e da décima de todos os rendimentos do trabalho), a protecção dos burgueses (“não eram obrigados a dar fiador por nenhuma infracção ou delito, para que estivesse prevista uma pena inferior a dois soldos”; “não se aplicam penas às aferições ou às aferições de medidas”; “protege-se a segurança nas deslocações”; “as causas relativas às herdades que os moradores possuírem fora do termo serão julgadas pelo foro da vila”; “é proibido fazer penhoras indiscriminadamente, admitindo-se apenas as que se destinarem a reivindicar o pagamento de dívidas”; “limita-se a obrigação de «carreira» por parte dos moradores, designadamente em regime gratuito ou oneroso para os donos dos animais de tiro”; e “nada mais os moradores eram obrigados a ceder, nem as trebolhas – os odres ou sacos –, nem as carroças – liteiras –, nem qualquer outra coisa, a não ser de livre vontade”), os confirmantes (três juízes, dois superiores religiosos e o mordomo régio, D. Gongalo Mendes de Sousa) e a confirmação de D. Afonso II, em 1218, são outros dos aspectos igualmente referenciados.
As páginas finais contêm uma reprodução do foral, acompanhada pela transcrição do texto e respectiva tradução.
No fim de várias páginas, existem notas de rodapé, tanto de natureza bibliográfica como explicativas.

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Conheça o autor

"António Matos Reis nasceu nos arredores de Ponte de Lima, em 21 de Abril de 1943, e reside e trabalhou em Viana do Castelo, desde 1975 até à data de aposentação. É mestre em História pela Universidade do Minho, apresentando uma dissertação em História Medieval, posteriromente publicada em 1991, com o título "Origem dos Municípios Portugueses". Tal obra veio a tornar-se uma referência obrigatória para quantos se debruçam sobre a história do municipalismo em Portugal. Obteve o doutoramento, em 2004 com a defesa de tese sobre "Os Concelhos na primeira dinastia". Especializou-se em Museologia, na U.I.A. de Florença, em 1977, e pós-graduou-se em Estudos Especiais de História e Crítica de Arte, na mesma Universidade, em 1984. A sua actividade profissional repartiu-se até à data de aposentação, entre o ensino secundário oficial (1966 - 1999) e a direcção do Museu Municipal de Viana do Castelo (1989 - 2006). Neste museu exerceu o cargo de Conservador. Foi também Director do Departamento de Desenvolvimento Económico, Social e Cultural da Câmara Municipal de Viana do Castelo, desde 10 de Maio de 1990 até 31 de Dezembro de 1993. Tem exercido funções de direcção em várias associações: Vice-Presidente e depois Presidente da Direcção do Centro de Estudos Regionais; Secretário-geral e depois Vice-Presidente do Instituto Cultural Galaico‑Minhoto; sócio fundador e membro da Comissão Instaladora do Instituto Limiano - Museu dos Terceiros; sócio fundador, membro da comissão instaladora e Presidente da Direcção da Associação de Jornalis­tas e Homens de Letras do Alto Minho. É membro de várias associações, entre as quais se destacam: a Sociedade Portuguesa de Estudos Medie­vais; a Sociedade de Museologia, de Florença; o ICOM (International Council of Museums); a APOM (Associação Portuguesa de Museologia); a ASPA; a APH; a APAC. Foi Presidente da Comissão Organizadora das IV Jornadas Regionais sobre Monumentos Histórico‑Militares (Valença, 1984); membro da Comissão Organizadora do Congresso sobre a Ordem de Cister em Espanha e Portugal (Ourense, 1992) e da Comissão Organizadora do V.º e do VI.º Colóquios Galaico-Minhotos (Braga, 1994; Ourense, 1996). Reorganizou o Arquivo Histórico da Misericórdia de Ponte de Lima, e promoveu a publicação do respectivo catálogo. Em 1995, fez o levantamento do Património Cultural, situado entre Caminha e Esmoriz, para o Plano de Ordenamento da Orla Costeira. É autor de cerca de centena e meia de títulos, entre livros, estudos e artigos publicados em diversas revistas. Proferiu já várias conferências, em congressos e colóquios, em Portugal e no estrangeiro. Por deliberação unânime de 27 de Janeiro de 1997, a Câmara de Ponte de Lima atribuiu-lhe a "Medalha de mérito cultural" que lhe foi entregue no dia 4 de Março do mesmo ano, na sessão solene comemorativa da fundação da vila."
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4- Obrigações e direitos

Barcelos, no século XII, enquadra-se no grupo dos burgos e póvoas, ou, mais exactamente, na segunda categoria. Os burgos eram aglomerados urbanos, de pequeno alfoz territorial, cujos moradores se dedicavam exclusiva ou quase exclusivamente ao comércio e aos mesteres. Fora dos arruamentos desses aglomerados, apenas lhes era normalmente consentido que apascentassem as bestas de carga, isentando-os do pagamento do montádigo. Classificamos como póvoas aqueles aglomerados em que a presença e a actividade dos burgueses é marcante, mas continua a ter uma expressão significativa o sector primário, designadamente a agricultura e, nalguns casos, a pesca, o que supõe uma amplitude maior do seu termo.
Nos burgos e póvoas do século XII, o imposto de base é a taxa fixa de 1 soldo (ou 12 dinheiros), por cada casa, no primeiro caso, e de metade, isto é, de 6 soldos, no segundo, com redução no caso das viúvas. É assim em Barcelos, onde, por altura das colheitas (S. Miguel) se pagava o tributo de 12 soldos, ou de 6, quando o chefe de família era uma viúva.

Como já referimos, o documento foi considerado um indículo, isto é, como um resumo ou apontamento sintético e não como um diploma acabado, em forma definitiva. Se este alguma vez existiu, já em 1218, na altura das confirmações, se tinha perdido. Admite-se também que, elaborado apressadamente por ocasião de uma passagem do Rei na localidade, nunca tenha merecido uma redacção mais aperfeiçoada. Como já verificámos em relação à data, as características do documento estão na origem de alguns problemas de interpretação, nomeadamente das cláusulas atinentes ao foro jurídico, penal e fiscal.
O Rei estabelece a respeito dos moradores: “do illis fórum ut habeant honorem Bracare et pectent decimam de calumpnia Bracare et decimam de toto labore”. Esta passagem tem sido interpretada, em nosso entender, como se dissesse: “Dou-lhes por foro a (mesma) honra de Braga e que paguem a décima da coima de Braga e a décima de todo o trabalho”. Com efeito, não parece lógico interpretar o foral como se ele determinasse que os vizinhos de Barcelos deviam fazer honra ou prestar homenagem a Braga ou ao seu Arcebispo, e ainda pagar-lhe os dízimos das coimas e dos rendimentos do trabalho.
Não seria coerente que, ao conceder a um município um foral cuja finalidade era a de o libertar de subserviências dominiais, paradoxalmente estivesse o Rei a determiná-las, cerceando os seus próprios poderes e a autonomia do município, e isso não obstante as melhores relações que pudesse ter com o Arcebispo de Braga. Por outro lado, nos arquivos da Sé de Braga, não consta da existência de qualquer registo dessa dádiva nem de qualquer referência à liquidação desses direitos ou à sua reivindicação. Normalmente, mesmo nas instituições eclesiásticas, é mais fácil encontrar referência a um direito no arquivo dos beneficiados do que no daqueles para quem ele se transformava num encargo.
Conhecemos outro foral, concedido a uma localidade relativamente próxima, Vila Nova de Famalicão, em que deparamos com cláusulas semelhantes. Nele se estabelece, com efeito
– quanto às coimas: que “non pectent nisi tres calumpnias illas que sunt asignate hominibus d’Ospitalis”, i. e., que não paguem senão aquelas três coimas que estão estipuladas para os homens da Ordem do Hospital.
– quanto às bestas de carga: “quod quicumque ibi habuerit bestiam vel bestias habeant illas per fórum Vimaranes, et non faciant illis tortum nec forciam super illas”, i. e., quem possuir animal ou animais de carga, tenha-os segundo o foral de Guimarães.
– e quanto às portagens: “et detis portagium quomodo dant in Sancto Petro de Ratis”, i. e., pagueis portagem como pagam os de S. Pedro de Rates.
Trata-se de referências em termos comparativos, que têm como finalidade, diplomaticamente, evitar a sua descrição exaustiva e mais longa no documento, e socialmente, estabelecer uma igualdade de tratamento para cidadãos que habitavam em localidades vizinhas.
No caso de Barcelos, as disposições do foral quererão simplesmente dizer o seguinte:
– os moradores pagarão uma décima da(s) coima(s) (decimam de calumpnia) igual à que pagam os moradores de Braga;
– os moradores pagarão a décima (de todos os rendimentos) do trabalho.
Estas importâncias seriam pagas ao Rei, embora cobradas pelo concelho, que pouco mais tarde as passaria a guardar para si, em troca de um censo anual que entregava ao monarca, como testemunham as inquirições de 1220.

A inquirição de D. Afonso II menciona, com efeito, os vários impostos a que os moradores são obrigados, referindo em último lugar os tributos correspondentes à administração da justiça e especialmente às coimas devidas pelas infracções e delitos, que são aquelas a propósito das quais no foral se faz referência a Braga. Ora logo a seguir diz-se: “Et modo est villa in renda pro CCV morabitinos”. Esta renda substituía os vários tributos locais, não excluindo vocem et calumpniam secundum suam cartam, que, ainda por cima, era a última obrigação a que a inquirição acabava de fazer referência.
Curiosamente, na inquirição de D. Afonso III não se faz menção desta renda, mas apenas dos tributos que ela substituía. Afigura-se, no entanto, oportuno salientar que, ao referir as coimas, embora numa linguagem que se pode considerar intermédia entre o latim medieval e a incipiente língua portuguesa, o testo da inquirição não admitirá dúvidas quando regista: “et pectam decima de caomia de Bracara”, expressão que de nenhuma forma pode traduzir um dativo e por conseguinte um pagamento de coimas à Sé de Braga.
Estas cláusulas remetem-nos para um momento anterior à outorga definitiva do foral, que corresponde à fase da informação prévia e da negociação, em que não era raro empregar termos comparativos, que por vezes deixaram a sua marca nos textos dos documentos: a muitas localidades foi dado o foral “de Salamanca”, a outras o “de Ávila”, o “da Guarda”, etc.; os habitantes de Melgaço pediram e obtiveram do Rei a concessão do foro “de Ribadavia”, assim como aos do Porto o Bispo outorgará “tam bonos foros quales habent in Sancto Facundo”.

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